No Trem

Oi, Rick.

É, você mesmo. Leia até o fim, ta legal? Prometa-me, ou só leia logo de uma vez.

 

Sei que não me conhece. Também deve achar que isso é loucura, caso tenha achado meu pequeno papel dobrado em dois. Eu te conheço, sabe? Conheço bem demais e ao mesmo tempo pouquíssimo. Conheço seus sorrisos, sua cara despreocupada, o balançar leve de seus pés ao som da melodia de uma provável música agitada ou embaladora e já ouvi uma ou duas (talvez umas três ou quatro…) conversas suas com uma loira artificial (bem peituda, infelizmente) quando estávamos esperando o trem, eu de um lado da plataforma, você do outro. Sei que não era da minha conta, mas não pude evitar ouvir. Virou rotina ver você conversando com ela, o nome dela era Natália, certo? Sempre gostei do nome Natália, aí ela aparece e o nome ficou meio enjoativo pra mim. Também não gostei dessa Natália porque ela tinha jeito de universitária alta e devassa, que mora sozinha e ilude garotinhos que acabaram de prestar vestibular em plataformas de trens alheias, impedindo que o mesmo repare na menina do Ensino Médio meio ciumenta posicionada estrategicamente próxima a escada. Enfim… A loira parou de aparecer depois de um tempo (ainda bem!). Esses dias a vi na linha azul há alguns meses aos beijos com um cara alto; você é meio baixinho pra ela, talvez ela goste de ficar com torcicolo olhando pra cima. Eu, por exemplo, acho sua altura perfeita, nem alto, nem baixo, perfeito! Vai ver que acho isso porque sou anãzinha… Ai ai! Estou enrolando tudo e não teho outro papel. Ou seja, não posso rasurar. O que eu quis dizer é que acabou virando rotina prestar atenção em ti. Nos seus gestos, em sua aparência, nas  suas mãos e em seus lábios, tens lábios grossos e carnudos, bonitos. Sinta-se feliz, são bem… Atraentes. Até corei escrevendo isso, mas enfim… Descobri seu nome e onde embarca e desembarca no trem, descobri que você gosta de pastel e que prefere suco a refrigerante. Coisinhas pequenas, sabe? Mas que me faziam e ainda fazem sorrir. Sei que é idiotice sorrir diante de um cara que come misto-quente, mas era bonitinho o jeito atrapalhado que você tentava passar ketchup e se lambuzava e tudo o mais. Sei que pareço absolutamente patética com esses comentários, mas não posso evitar (perdi meio que o senso e a razão nos últimos meses por tua causa, e o pior… nem me importo mais!). Eu queria lhe dizer algo, na verdade pedir algo. Mas primeiramente… Relaxa, ta legal? Eu não sou uma doida que te segue (eu posso ser meio insana sim, mas não doida ao ponto de constrangê-lo, sequestrá-lo ou algo parecido). Só gosto de ti, e gostar não é pecado (assim espero!). Voltando ao assunto… Quando eu comecei a ter intenção de te mandar algo… Primeiramente eu ia te escrever uma carta bem bonita pra ver se saía melhor no jeito de escrever com as palavrinhas bonitinhas, mesmo com minha letra pavorosa, sem parecer tão confusa. Ou mandar um bilhete curto, direto, simples e certeiro. Depois, pensei em escrever no guardanapo de um restaurante (costuma ser tão charmoso escrever no guardanapo! Pena que não frequento restaurante, só lanchonetes… Sou uma típica adolescente, que ouve Barão Vermelho). Quem sabe lhe enviar qualquer coisinha escrita a caneta esferográfica preta, ou azul… O que estiver mais próximo. Talvez no guardanapo eu escrevesse meus lábios com batom vermelho, no intuito de ser sensual, coisa que definitivamente eu não costumo ser. Mas pensei que talvez isso fosse ultrapassado, me dizem que o romantismo morreu, ando quase acreditando. Falar pessoalmente estava fora de cogitação, sou péssima com essa coisa pessoal, sabe? Sou bem travadinha, por isso o treco de escrever. Então… Quis lhe mandar um e-mail, era prático, rápido, fácil e eu vivo escrevendo e-mails, sabe? Seria mais fácil e qualquer coisa eu seria ignorada ou daria erro na sua caixa de entrada do e-mail e tudo ficaria bem. Ou ficaria pior ainda. Mas não importa! Eu mandaria o tal e-mail, cruzando os dedos e quase tendo um piripaque,  e seja o que Deus quiser!  Aí me dei conta que  não conheço seu endereço eletrônico. Voltei a optar pela carta, mas aí percebi que também não conheço seu endereço residencial. Sem endereços como lhe mandar meus escritos, meu desabafo? Aí fica difícil… Concluo, sentada na mesa da cozinha, irritada, magoada, choramingando (Eu não sou mimada, só sou meio exagerada, meio drástica e dramática e acredita que ainda costumam dizer que sou centrada? É praticamente uma piada!). Acabei ficando pra baixo depois de perceber como fui tola e ingênua. É isso que dá amar quem só se sabe o nome e conhece a alma, não as memórias. Eu poderia dizer que te amo, sabe? Mas não quero te assustar ainda mais. Ás vezes acho que te amo de longe, platonicamente falando, ás vezes acho que tenho possibilidade de amar você futuramente, se nos conhecermos melhor. Ás vezes eu acho que é insanidade, o que é o mais certo, mas eu costumo ignorar. Não sei  e você também não sabe. Definitivamente, eu não sei. Tenho muitos problemas quanto a conclusões. Tenho medo de estar me precipitando e não te amar. Mas ao me ver presa a esses borboletas no estômago, passarinhos sobrevoando meus pensamentos me levando até a ti, tremeliques e ciúminhos chego a conclusão que quero-te pra mim. E amor é meio que posse. Meu amor é possessivo. Junta-se a um artigo e aí tudo fica certo. Ele é meu. Sendo que o ele é você e o meu amor. Ahh confundo-me, mas continuo amando. Estou escrevendo isso aqui, em um papel qualquer pra te deixar no banco do trem pra quem sabe você ler. E quero terminá-lo com um pedido simples. Me manda um endereço. Eu prometo que você não vai se decepcionar. Pode ser um endereço comprido, cheio de voltas, de ruas, de vírgulas, pontos, de arrobas. Ou você poderia me mandar um mais complicado ainda. Não um endereço do outro lado da cidade. Me escreve e deixa nesse mesmo banco do trem o caminho do seu coração. Prometo cuidar direitinho, e tal endereço facilitaria muito minha vida. Quando se tem o endereço do coração, os outros ficam muito mais fácéis de se arranjar… Amor resolve a maioria das coisas e complica outras. Sabe… Confesso sem vergonha nenhuma que quero que resolva meus dilemas e complique meus lábios com os teus, bem grossos. Sorria pra mim da próxima vez. Sou aquela menina estranha de all star velho e shorts surrado, com mochila e fone de ouvido (um deles está quebrado, nenhum fone meu dura mais de dois meses. Minha quietude é destruidora).Você nunca me notou. O que é uma façanha e tanto. Eu grito no meu silêncio, tanto que todos me olham, alguns até sorriem… É calmante, sabe? Gosto de sorrisos. Enfim… Eu gosto da palavra enfim, resolve muitas complicações minhas. En-fim, me manda o endereço, o telefone, os lábios, o coração, a alma. Só algo pra eu poder apertar, segurar em meus dedos protetoramente, aí em troca eu lhe dou meus sorrisos e coração, só pra você me corresponder nesse joguinho de cartas de amor. Só sorria, ta? Pouco ou muito, só preciso de um sorriso teu. Que confesso(mais uma confissão!)… É o endereço mais rápido para a minha felicidade.

 

Assinado, Garota que gosta de reticências, da palavra enfim, usa constantemente pronomes possessivos e gosta do seu sorriso e que preferiu ser sincera consigo mesmo e honesta contigo porque acredita que assim é o jeito mais rápido de não só conseguir um reles carinho, mas ao menos um sorriso da pessoa querida. Então… Sorria! Pela primeira ou última vez. A escolha é sua, Rick. 

 

Autora: Janine Oliveira

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Data 27/02/2012
De Domingos
Assunto Perfeito

O conto é perfeito. Cheio de melodrama, sarcasmo. Muito bacana, mesmo. Parabéns Janine pela sua autoria. Perfeito!

 

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