Chegamos perto de Igor, que bebeu seu copo de cerveja de uma vez só. Olhando minha mão na de Alexandre, entrelaçadas. Ele tinha agora o maxilar trincado e sua expressão me deixou curiosa, a primeira vez que eu via seu rosto tomado por algo assim.
– Oi. – murmurei, olhando para Ceci. Que deu um sorriso amarelo.
– Não achei que vocês viriam.
– Alexandre me convenceu a vir. – sorri, surpresa por eu estar alimentando a conversa.
– Eu vou falar com uns conhecidos. Volto já. – Ceci disse se afastando, magicamente seus amigos acabaram sumindo também. Ficamos só nós três, um olhando pra cara de taxo do outro. Alexandre bufou, mas tentou iniciar uma conversa com Igor. Eles começaram a conversar e eu revirei os olhos pelo cinismo deles. Me distrai, olhando o movimento da praia. Depois os encarei, os murmúrios já haviam acabado. Eles se encavam, a expressão raivosa. Me perguntei o que perdi. Alexandre olhou para mim, sério.
– Eu já volto. – Ele disse, já andando, os olhos fixos na direção que Ceci tinha acabado de ir. Ele beijou minha bochecha de leve enquanto passava e eu revirei os olhos. Olhando para Igor. Ele falou calmamente, tomando um gole da sua cerveja:
– Não vai fugir? – ri baixo. Surpresa, porque não estava me sentindo verdadeiramente incomodada dessa vez.
– Vou esperar Alexandre voltar, pra não me perder dele.
– Huum... – Ficamos em silêncio, olhando as pessoas passarem. – Então você e ele... juntos?
– Pois é.
– Por quê? – olhei para ele, que parecia exasperado agora. Ergui a sobrancelha, confusa.
– Porque o que?
– Porque vocês estão juntos? Quer dizer... Eu sei que ele gosta de Ceci. É meio óbvio. – rngoli em seco, sentindo meu bom humor desaparecer. – Mas isso não te incomoda? Saber que seu namorado gosta da sua irmã?
– Todos gostam mais de Ceci, é um fato e... – respirei fundo, fazendo um joinha leve pra ele. – Obrigada por esfregar isso na minha cara.
– Não foi isso que eu quis dizer...
– Foi exatamente isso sim. Não se preocupe. E... Eu estou com Alexandre, porque ele me faz bem. – Ficamos em silêncio novamente. Ouvi-o sussurrar baixinho:
– Eu fazia você se sentir bem? – pensei um pouco nisto e acabei optando pro ser sincera optei por ser sincera:
– Não sei responder. Não sei se você era você mesmo antes. Não sei nem quem é você agora.
– Quem eu sou? – Ele sorriu de leve. – Essa é fácil... Eu sou Igor aquele que ama...
– Minha irmã. – interrompi, não sabendo muito bem se queria ouvir a conversa.
– Eu amo uma Maria. Só que ela é orgulhosa demais para me deixar dizer isso. – fiquei sem fala por alguns segundos, depois balancei a cabeça em desaprovação:
– Você gosta de complicar tudo. Não gosta de me ver feliz?
– Claro que eu quero você feliz. – Ele disse de um jeito que parecia tremendamente óbvio.
– Então porque não me deixa em paz?
– Talvez pelo mesmo motivo pelo qual você fuja de mim. – revirei os olhos, não gostando do rumo da conversa. Ficamos em silêncio por um segundo, até ele quebrá-lo, a voz decidida. – Eu definitivamente vou terminar com Cecília.
– Não! Vocês estão bem juntos e eu estou com Alexandre.
– Você não ama Alexandre. E eu não amo ela...
– Pare de dizer isso. Torna tudo pior pra mim, sabia? – mordi o lábio. – Eu estou tentando superar algo aqui. Colabore.
– Eu não posso.
– Porque terminar? Já chegou até aqui. Estamos pagando de amiguinhos, eu estou namorando. E está durando mais de 48 horas. O que é um avanço e tanto. E você e Ceci... Porque terminar logo agora?
– Porque eu não a amo. Porque estamos mentindo um para o outro. Porque ela não me ama também. Porque eu não sou mais uma criança, eu tenho uma vida agora, eu moro sozinho, tenho meu emprego, meu carro e eu não posso me comportar como uma criança mimada, que não se contenta em não ter as coisas tão fáceis assim. Eu estou regredindo, e isso é um saco! Eu não sou o centro do universo, e eu não posso obrigar o mundo a girar na direção e na velocidade que eu quero porque eu perdi muitas coisas. Eu entendo isso agora. – engoli em seco, amaldiçoando meu coração que perdeu completamente o ritmo. – Não que eu tenha feito de propósito, eu só... Eu fui egoísta por tempo demais. Eu perdi você por ser egoísta, eu magoei você por ser egoísta, e eu provavelmente vou magoar Cecília pelo mesmo motivo. Eu não quero me sentir mais assim, não quero continuar fazendo isso com a sua irmã, com você e admito, comigo também. Eu ando agindo como um garoto perdido, porque uma certa garota me bagunçou totalmente. Mas eu esqueci que a culpa não é dela... Que se eu a quero de volta, eu tenho que lutar pra isso.
Tentei me recuperar de suas palavras. Sentindo o ar faltar e as bochechas corarem. Senti dificuldade de sustentar o seu olhar, parecia que me queimava. Tentei encaixar as palavras, encontrar algum sentido, mas eu não conseguia. É como se meu cérebro não conseguisse processar. Eu tentava repassar a conversa na mente, mas meu coração conseguia bater mais alto que os meus pensamentos. Coloquei a mão nele, tentando silenciá-lo. Olhei de volta para Igor, que aguardava alguma resposta minha. Gaguejei as palavras, ainda confusa:
– Realmente álcool deixa as pessoas insanas.
– Eu não estou bêbado. – Ele bufou.
– Está agindo como um. – suspirei, ainda em choque com suas palavras.
– Amor é bebida e ressaca. Ele só não é um bom analgésico.
– E também não é um bom sal de frutas. – declarei, entrando no joguinho ridículo. Ele riu baixo, depois mordeu o lábio, me encarando.
– Eu te perdi, mas eu ainda sinto como se você fosse minha.
– Isso é errado. – sussurrei. Me afastando de leve.
– Eu sei disso. Mas eu não posso evitar. – Ele sussurrou de volta, seus olhos queimando nos meus. – E nem quero evitar.
– Eu gosto de Alexandre... Não posso deixá-lo. – continuei, sussurrando.
– Eu gosto de Ceci também. Mas ela merece algo melhor.
– Ela precisa de alguém que amadureça junto com ela. Talvez você seja a pessoa. Você faz bem a ela, eu vejo isso. – olhei para o chão, fugindo daqueles olhos penetrantes.
– Não, não mais. Eu não posso mais tentar também. – O encarei, sem poder me conter. Ele me analisava também, sem desviar os olhos dos meus. Sustentei o seu olhar, teimosamente. Um meio sorriso surgiu em seu rosto. Mordi o lábio, em conflito.
– O que vocês dois estão fazendo? – Cecília apareceu, tinha a expressão desconfiada. Percebi que Igor estava perto demais de mim, me afastei. Confusa e ainda em choque pela nossa conversa.
– Nada. – respondi, me virando de lado. Dando espaço para eles. Tentando me controlar e processar as palavras de Igor. Procurando Alexandre com o olhar. Me virei para Ceci, me lembrando que Igor queria terminar com ela por causa de... nós. Senti uma onda de culpa me varrer. O que diabos eu estou fazendo? Olhei em volta, a boca seca, procurando meu namorado. – Você viu o Alexandre?
– Não... A propósito, porque está mentindo desse jeito? – Seu tom agressivo me surpreendeu.
– Como?
– Eu sei que vocês não se gostam. – Ela disse simplesmente.
– Como pode saber que não nos gostamos?
– São amigos. É isso que vocês são. Não podem ser namorados. – senti a ironia gritante por trás de suas palavras. Ela estava pior que irônica, ela estava agressiva e venenosa.
– Isso não é da sua conta, Cecília.
– Você nunca prende um namorado, Malu. Ainda mais um mulherengo como Alexandre, e se ele te trair? Sei lá... Pode acontecer. – Ela sorriu diabólica. Me perguntei o que ela tinha. Eu sabia que eu deveria fazer para não esquentar a cabeça. Ignorar. Ceci tinha esses seus ataques, sempre frequentes, de criança mimada. Eu sempre ignorava. Mas dessa vez, doeu. Senti a mágoa enchendo meu peito e mordi a língua, magoada. Havia certa verdade por trás do que ela me disse.
– Cecília! Para com isso. – Igor interviu, tentando segurá-la pelo braço.
– O que foi? É a verdade. – Ela se afastou do braço de Igor com desenvoltura. – Estou tentando evitar que ela se machuque. A verdade pode doer.
– Porque está dizendo isso? Ele nunca faria isso com uma garota como a Malu.
– Uma garota como a Malu? Qual o diferencial dela? – Vi seu rosto mudando de cor. Atingindo uma cor de vermelho berrante. Apenas fiquei assistindo a briga do casal, mais chocada impossível. – Não entendi o que você está sugerindo. O que ela tem de especial, hein, Igor?
– O que está dizendo? Ela é sua irmã! – Igor também parecia chocado com a atitude dela. Pelo visto, ainda não tinha presenciado ela tendo um ataque, ainda. – Você antes de todo mundo deveria ver suas qualidades.
– Irmãzinha? Ah me poupem.
– O que está dizendo?
– Vocês acham mesmo que eu sou idiota? Que não tem algo rolando entre vocês?
Foi como se uma bomba tivesse explodido naquele ambiente. Droga! Percebi subitamente que várias pessoas assistiam a briga. Pelo menos os mais próximos. Igor trocou olhares comigo, igualmente chocado. Olhamos de volta para Ceci, que parecia que iria pular em nossos pescoços a qualquer momento. Me perguntei o que tinha feito ela de súbito explodir assim.
– Você está bêbada. Não está dizendo coisa com coisa! – gaguejei as palavras, praticamente atestando minha culpa. O problema, é que eu não me sentia totalmente culpada. A culpa vinha do beijo e da conversa que eu tivera com Igor recentemente. Mas eu me sentia mais como a vítima. Quer dizer, ela me fez viver com ele próximo a mim. Ela me fez passar novamente por isso. Ela me disse coisas terríveis. E ainda assim ela brava comigo. Eu é que tinha que ouvir essas coisas! E no final das contas eu era a péssima irmã. Era terrivelmente injusto.
– Admita Malu... Você está tentando tirar o Igor de mim!
– Está louca?! – Eu nunca quis tirar ele, dela. Eu aceitei, não aceitei? Meu Deus, porque eu estava passando por isso? Não era ruim o suficiente tudo que eu estava passando?
– Vocês vivem brigando e no final, eu sempre acabo brigando com ele também! Eu queria que vocês fossem amigos, mas vejo que vocês já passaram desse estagio.
– Você está inventando coisas, Ceci. Eu nunca tiraria um namorado seu. – Eu não seria tão mesquinha, tão filha da mãe assim. Ia totalmente contra meus critérios, contra quem eu era. E afinal de contas, ela era minha irmã, poxa!
– O que você tem, Cecília? – Igor disse, finalmente falando algo.
– Só estou juntando os fatos.
– Ai, cala a boca! Estou cansada de você, Cecília. – A raiva explodiu naquele momento. A mágoa deu lugar ao rancor. E antes que eu pudesse ver eu estava quase gritando. A voz elevada e carregada de nervosismo. – Uma hora está toda boazinha, querendo que eu e seu namorado sejamos amigos. E do nada diz que temos algo mais? Pelo amor de Deus. Nós não nos suportamos. Você tira essas coisas do nada, sempre querendo arranjar discórdia. Sempre querendo que eu me sinta um lixo. Admito, hoje você está conseguindo. Isso te deixa satisfeita? Então acabe logo com a droga desse teatro. Quer saber? Eu vou pra casa. – Olhei ao redor, procurando Alexandre.
– Eu se fosse você, nem procurava. Eu vi ele conversando com a Ana, é uma ex dele não é? – Me afastei, um pouco chocada. Subitamente senti meus olhos se enxerem de lagrimas. Eu não merecia isso.
– Tudo bem, eu vou pra casa sozinha. – virei as costas, deixando os dois discutindo para trás. Eu estava completa e inteiramente raivosa com o que estava acontecendo. Morrendo de raiva de Ceci e de Alexandre, totalmente magoada, e ainda não acreditando como minha tarde fora estragada por esses dois. Ou seria por esses três? Percebi que não era só a minha tarde que estava estragada. Eu também tinha virado um lixo ambulante. Sentia os caquinhos do meu coração pela areia enquanto andava. Era um terrível dejá vu.