Fiz menção de dar meia volta, mas ele me viu primeiro. Caminhei rápido, passando pelo banco. Totalmente aflita. Infelizmente ele se levantou e segurou meu braço, com muita força.
_Me solta._Choraminguei, a voz chorosa. Percebi que chorava. Orgulhosa do jeito que sou, limpei os olhos com a mão livre para que ele não visse as lágrimas.
_Malu, por favor… Me escuta._Notei um desespero em sua voz, mas tudo que eu queria é que ele sumisse.
_Me solta!
_Eu queria…
_Cala a boca! Você não quer nada! Não poderia querer nada! Você é um idiota. Me deixa em paz!_Puxei o braço com força, sentindo um pouco de dor, sua mão apertava meu braço com força demasiada.
_Solta ela. Agora!_Uma voz alta chegou perto. Aquele garoto, o do 'hey', estava parado próximo a mim.
_Você não tem nada haver com isso.
_Solta ela.
_Você ta me machucando!_Gritei histérica e Igor soltou meu braço rapidamente. Cambaleei para trás e o garoto do ‘hey’ me puxou pelo pulso, me fazendo ficar atrás dele.
_Malu…
_Você não ouviu a garota dizendo pra você deixar ela em paz? Porque eu ouvi! Sai daqui, agora.
_Não se mete…_Igor parecia ameaçador. O garoto deu um passo à frente e eu me agarrei a seu braço, o puxando para trás. A expressão de Igor vacilou.
_Vai embora, Igor. Você não existe mais para mim. Me deixa em paz._Eu disse,a voz firme. Puxei o garoto pelo braço, que ainda encarava Igor com determinação. Quando virei às costas comecei a chorar mais ainda, ele passou os braços pelo meu ombro.
E me puxou para o lado oposto a entrada no hotel. Acabamos parando em uma mesa, com um grande guarda sol, fazia parte da propriedade do hotel. Limpei as lágrimas, querendo não me sentir tão patética assim.
_Não sai daqui, eu já volto._Olhei para ele que sumiu dentro do hotel. Olhei para o alto, olhando o guarda-sol e tentando fazer as lágrimas não escorrerem. Respirei fundo, me acalmando. _Cheguei.
Ele sentou-se no banco e depositou um enorme pote de sorvete de chocolate e duas colherezinhas na mesa. Além de uma barra de chocolate enorme ao lado.
_O que é isso?
_Anti-depressivos. São bem eficientes, confie em mim._Ele sorriu e eu tentei sorri de volta. Ele abriu o pote e pegou uma colher, parecendo confortável mesmo nessa situação constrangedora e levou a colher cheia até a boca, fazendo um gesto para que eu o imitasse. Peguei a colher, sentindo a mão trêmula. Levei até a boca, até o chocolate parecia ter um gosto amargo._ Eu até poderia perguntar o que aconteceu, mas isso não é da minha conta.
_Obrigada, de verdade._Levei a colher a boca novamente, sem saber o que dizer._Não tenho nem como te contar, ainda não entendi tudo muito bem. E a história é muito grande.
_O pote de sorvete é bem grande e eu tenho a tarde livre. Não tenha pressa se isso for te ajudar.
_Costuma ser tão gentil assim?_Ele sorriu._ Como é seu nome mesmo?
_Alexandre.
_Eu sou a…
_Malu.
_É._Parecia que todo mundo aqui sabia o meu nome, então nem me impressionei.
_Desculpe, Alexandre, mas não sei se quero explicar o que aconteceu. Não acho que vá ajudar.
_Tudo bem._Ele empurrou o pote de sorvete e percebi que ele ficaria ali por um bom tempo. Fiquei sem falar nada, sem cabeça para conversar. Apenas me empanturrando de sorvete, percebi agora que o gosto não era tão amargo. Estava bom, embora minha língua estivesse começando a ficar anestesiada por causa do gelado. Ele começou a falar de assuntos leves e ficamos surpresos em saber que ele morava na mesma cidade da minha mãe. Continuamos conversando, ele parecia disposto a me distrair. Mas estava difícil, eu diria impossível.
_Alexandre, desculpe… Mas eu preciso me deitar.
_Ta bom. Qualquer coisa… Eu to por aí.
_Certo. Obrigada._Sussurrei, me levantando.
_Disponha._Sorri e sai de perto dele. Enquanto andava sentia a tristeza voltando. Tentei me apegar à raiva, mas a dor da traição era pior. Subi de elevador e, surpresa, encontrei Cristina, próxima a minha porta.
_O que houve com você? Porque seus olhos estão tão vermelhos?_Porcaria! Abaixei a cabeça e caminhei para a porta, mas Cristina bloqueou o caminho._É por causa daquele seu novo namoradinho surfista? Oh, pobrezinha. Ele cansou de você?
_Sai da frente!
_Isso é bem normal ele te dar um fora. Não fique triste, eu vi como ele era lindo… Muito para você. Aceite querida, não fique se lamentando._Senti os olhos arderem e a garganta apertar. Eu não precisava ouvir isso, não precisava mesmo._ Aceite que você é bem sem graça e isso aconteceria mais cedo ou mais tarde.
_Sai da frente!_Empurrei ela, que cambaleou. Se apoiando na porta ao lado para não cair.
_Cuidado, ridícula! Seu pai vai adorar saber que você me empurrou, ainda mais no meu estado!
_Estado? Que estado?
_Seu pai ainda não te contou, queridinha? Você terá mais um irmãzinho…_Parei com a mão na maçaneta, absolutamente chocada. Engoli em seco e entrei no quarto, batendo a porta com força. Respirei fundo, sentindo o choro voltar com ainda mais força. Me joguei na cama, me encolhendo e fiquei ali, sentindo raiva, dor, humilhação, vergonha. Eu queria desaparecer! Eu nunca me sentira tão idiota na vida, nem tão magoada. Nunca me sentira tão abandonada. Mais do que isso era decepção. Porque o único cara que eu confiei fizera isso comigo.
Ouvi batidas na porta e ignorei.
_Malu?_Ouvi a porta ranger e percebi que meu pai entrara no quarto._O que aconteceu?
_Vai embora._Choraminguei; a cara enfiada no travesseiro.
_O que aconteceu? Cristina me contou que…
_Para de falar dela pai! Eu não quero saber dela.
_Mas ela vai ser sua nova…
_Não! Ela nunca vai ser a minha mãe! Não se onde você estava na cabeça quando achou que trazer nos duas pro mesmo hotel ia adiantar alguma coisa! Eu odeio ela e ela me odeia! Não está óbvio? Eu odeio ela, pai.
_Você só está chateada.
_Para de falar como se me entendesse pai. O tempo todo foi assim, você não entende, nunca vai entender. Eu não a suporto e sei que ela não vai sair da sua vida. Nem quero isso, mas… Não tente me fazer ser amiga dela, eu não posso! Eu não quero! Eu só… Quero sumir, pai.
_Cristina é uma boa moça e ela…
_Vai ter um bebê. É eu já sei. Não sei se posso lidar com isso agora, pai.
_O que esta dizendo?
_Eu quero ir embora. Eu quero passar um tempo com a minha mãe. Você disse que eu poderia fazer isso quando eu quisesse. Eu quero. Eu quero ficar um tempo longe, eu quero ir embora.
_Maria…
_Não me chama de Maria. Por favor… Por favor.
_Sua mãe vai ficar feliz em você passar um tempo com ela._Ele sorriu, tristonho. O abracei, sem dizer nada.
_Obrigada._Fechei os olhos, me sentindo feliz e despedaçada ao mesmo tempo. Eu iria ficar longe desse lugar e… Iria sentir falta desse lugar. Eu só queria ter memória seletiva e esquecer, esquecer tudo.